Retomar
os estudos interrompidos no 8º ano, morar com o filho na mesma casa e
cursar faculdade. Os atuais planos de Ivanilda Conceição Gomes, 26 anos,
podem parecer simples, mas apenas quatro anos atrás, quando ela ainda
trabalhava em um lixão de Maceió (AL), nem mesmo sonhos a catadora
acreditava que podia ter. “Que futuro a gente podia sonhar ali? A gente
trabalhava pesado para tirar o sustento do dia seguinte. Para mim, o que
mais mudou com a cooperativa foi a minha autoestima”, relembra.
A
história de Ivanilda, que trabalha na Cooperativa dos Catadores da Vila
Emater (Coopvila), em Maceió, une-se ao relato de mais de 1,5 mil
catadores de todo o Brasil e de 15 países da América Latina. Eles
estarão reunidos até sexta-feira (30) para trocar experiências na
capital paulista, durante a quarta edição da Reviravolta Expocatadores.
“Aqui
as pessoas se encontram para fazer um intercâmbio. Tem cooperativas em
diferentes níveis de organização. Há algumas que estão dentro de lixão
ainda. A interação faz com a gente consiga resolver os problemas”, diz
Severino Lima Júnior, da equipe de articulação do Movimento Nacional de
Catadores de Rua (MNCR), entidade organizadora do evento. O movimento
estima que mais de 600 mil pessoas no país trabalhem na coleta de
materiais recicláveis.
Coopvila reúne 27 trabalhadores da
periferia de Maceió, no mesmo local onde funcionava um antigo lixão
desativado há dois anos. Ivanilda conta que no começo foi difícil manter
o nível de faturamento que os catadores tinham quando buscavam o
material no lixão. “As pessoas trabalhavam dia e noite e tinha muita
concorrência. Dava para pegar mais coisa, mas a gente corria muito
risco. Não sei como a gente não pegava doença naquela época”, relata.
A
catadora relata que nos primeiros três meses cada cooperado ganhou
apenas R$ 92. “Agora cada um leva uns R$ 400 por mês, que é parecido com
o que se conseguia antes”, comemora. Para aumentar o faturamento, eles
saíram a campo para conquistar os atuais 80 parceiros, entre
condomínios, lojas e supermercados. “Para aumentar essa quantidade, a
sociedade precisa se sensibilizar e separar o lixo”, defende. Apesar de
um rendimento ainda abaixo do salário mínimo, Ivanilda aponta que a
organização trouxe outros ganhos, como segurança e direitos
trabalhistas.
O MNCR aposta que relatos como o da cooperativa
alagoana ajudam outras entidades a persistirem no processo de
organização. “As pessoas observam as conquistas dos outros e sabem que
podem avançar também. O modo de resolver os problemas também são
divididos, por exemplo, como acessar os recursos disponíveis em projetos
governamentais”, avaliou Severino.
Como resultado do
processo de organização dos catadores, iniciado há 11 anos, Severino
destaca a possibilidade de as cooperativas poderem acessar diretamente
os recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES), por meio do Banco do Brasil.
Durante a abertura do
evento nesta quinta-feira (29), o ministro-chefe da Secretaria-Geral da
Presidência da República, Gilberto Carvalho, entregou um cartão
simbólico para os catadores. “Vou falar para a presidenta Dilma que
devemos continuar a apoiar os catadores que por muito tempo estiveram
excluídos”, destacou.
“Agora a gente não precisa ficar
pedindo caminhão, prensa, equipamentos nas prefeituras. É uma grande
conquista. A gente tem a mesma possibilidade das grandes empresas. É o
reconhecimento que as cooperativas têm condições de assumir compromissos
financeiros”, avaliou o representante do MNCR. De acordo com o Banco do
Brasil, o crédito é concedido a partir da avaliação da capacidade de
assumir os empréstimos de cada cooperativa e pode ser pago em até 60
vezes com juros pelo menos três vezes menor que o mercado.
Os
recursos vão ajudar o presidente da Associação de Catadores de
Nilópolis (Acaman), Luiz Antônio Facchini, 60 anos, a mudar o modo de
produção na cooperativa fluminense. “A gente prensa o plástico com o pé e
o material a gente pega com um carro velho”, relata. Apesar da falta de
equipamentos, os dez cooperados da Acaman faturam cerca de R$ 800 por
mês, segundo o presidente.
A associação é a esperança de uma
aposentadoria para Luiz, que trabalha com reciclagem a 20 anos, dos
quais 16 foram na rua. “Tinha muito preconceito. Agora as pessoas olham
diferente quando você diz que trabalha em uma associação de reciclagem”,
declarou.
Na pauta da organização dos catadores, está a
implementação da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). “O
catador é peça fundamental nesse processo. As prefeituras vão ser
estimuladas a firmar parcerias com as cooperativas, pois só assim vão
poder acessar determinados recursos federais. Nós também estamos nos
preparando para isso, para receber a demanda que vai aumentar”, prevê.
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